Texto de Teresa Venda
1. “A vida humana é inviolável. Em caso algum haverá pena de morte”, assim dispõe o artigo 24.º (Direito à Vida) da Constituição da República Portuguesa.
A inviolabilidade da vida humana é acima de tudo uma questão de direito natural e aí se alicerça a dignidade da pessoa humana inerente a cada um desde o momento da concepção.
Hoje para compreender esta realidade não é necessário partilhar uma visão cristã de vida. Não se trata de uma verdade de fé, mas de uma verdade que a razão e a ciência vieram reconhecer.
Hoje está demonstrado que o óvulo fertilizado do ser humano contém toda a informação genética que presidirá ao seu desenvolvimento até ao nascimento e daí até à idade adulta. Como tal o embrião humano é desde logo vida humana.
Em suma, do ponto de vista biológico interromper de forma voluntária uma gravidez é eliminar uma vida humana. Se deve ou não ser considerado crime é um problema de relação entre a ordem moral e a ordem jurídica, contudo esta só pode ser justa se obedecer aos princípios fundamentais daquela.
O que volta a estar em causa na questão que irá ser colocada à consideração dos cidadãos portugueses no próximo Referendo, é saber se concedem ao legislador a prerrogativa de decidir até quantas semanas ou meses se pode eliminar uma vida humana sem ser criminalizado. Dar uma resposta favorável é de um ponto de vista estritamente positivista considerar que a vida humana no útero da mãe não têm valor suficiente para ser considerada inviolável, e isso é inaceitável.
2. Descriminalizar ou liberalizar a interrupção voluntária da gravidez é, por outro lado, admitir a demissão do Estado no garante de direitos fundamentais.
É aceitar que o Estado se possa demitir de assegurar um sistema de planeamento familiar funcional e eficiente, é aceitar que o Estado não promova condições que garantam uma vida condigna a mães sem posses, mas que desejam levar para a frente uma gravidez, ainda que não planeada.
Finalmente, aceitar a descriminalização é também admitir que o Estado se demita de assegurar os mecanismos que garantam uma sobrevivência digna aos deficientes, às crianças abandonadas e mal tratadas. É aceitar que o Estado se demita de promover alternativas inclusivas, de forma a activamente procurar remover as causas que levam uma mulher a abortar, causas que muitas vezes estão ligadas a problemas de pobreza, exclusão e isolamento. Enfim, é definitivamente aceitar que o Estado não prossiga uma função pedagógica de valorização da vida
3. A interrupção voluntária da gravidez não é redutível a uma questão de maternidade consciente, a uma afirmação dos direitos da mulher e da sua liberdade de escolha. À excepção do direito à vida, nenhum direito é absoluto, e como tal não é legítimo aceitar qualquer delito contra a vida como fundamento de defesa de uma liberdade individual, e que neste caso não será um direito – porque este é sempre justo – mas expressão de um “livre arbítrio”. Paralelamente, o facto da decisão se restringir a um livre arbítrio da mulher grávida, limita o correlativo direito do homem de, enquanto pai, poder optar pela paternidade.
Falar de liberdade individual é falar de responsabilidade e da dimensão ética que deve estar associado ao justo uso da liberdade, isto é, da consideração do bem e do mal moral.
O conhecimento que hoje temos da vida uterina não pode ser ignorado e torna moralmente indefensável, numa sociedade que defende os direitos humanos, que o aborto seja considerado um direito
A lei que impede o aborto livre visa defender o direito à vida de um ser humano. Nesse sentido, a liberdade só se realiza quando se age em prol da “causa humana”. Assim se exerce uma cidadania responsável.